A Polícia Federal (PF) concluiu que a disseminação de narrativas golpistas durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro fomentou um ambiente propício para ações extremistas, como o atentado com um homem-bomba no Supremo Tribunal Federal (STF) ocorrido em novembro de 2024 e os atos de vandalismo de 8 de janeiro de 2023.
A conclusão integra o relatório que indiciou Bolsonaro e outras 36 pessoas por tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito. O sigilo do documento foi levantado nesta terça-feira (26) pelo ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito no STF.
Segundo o relatório, a difusão "rápida e repetitiva" de narrativas golpistas manteve viva, entre grupos extremistas, a intenção de consumar um golpe de Estado. "Esse método de ataques sistemáticos aos valores mais caros do Estado democrático de direito criou o ambiente propício para o florescimento de um radicalismo que culminou nos atos do dia 8 de janeiro de 2023, mas que ainda se encontra em estado de latência em parcela da sociedade", afirma o texto.
Outros episódios de radicalismo
Além dos atos golpistas de janeiro, a PF cita episódios anteriores relacionados ao mesmo contexto de instabilidade. Entre eles, a tentativa de invasão da sede da Polícia Federal em Brasília, em 12 de dezembro de 2022, e a tentativa de explosão de um caminhão-tanque no aeroporto da capital em 24 de dezembro de 2022.
No caso mais recente, de novembro de 2024, um homem-bomba foi detido ao tentar explodir um artefato no STF, o que a PF também atribuiu à persistência das narrativas extremistas.
Envolvimento direto de Bolsonaro
O relatório aponta Jair Bolsonaro como participante ativo na articulação de um golpe de Estado. "Os elementos de prova demonstram que o então presidente planejou, atuou e teve domínio direto dos atos executórios realizados pela organização criminosa com o objetivo de concretizar o golpe de Estado", afirma o documento.
Entre os planos atribuídos ao grupo está o chamado "Punhal Verde e Amarelo", que previa ações como o sequestro ou assassinato de figuras de destaque, incluindo o ministro Alexandre de Moraes, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o vice-presidente Geraldo Alckmin.
Apoio militar limitado
Embora o relatório cite o almirante Almir Garnier, comandante da Marinha à época, como colaborador do plano ao colocar tropas à disposição de Bolsonaro, o golpe não foi consumado pela ausência de apoio dos comandantes do Exército e da Aeronáutica, o que inviabilizou a mobilização das Forças Armadas.
Documento "Lula não sobe a rampa"
Outro elemento relevante do inquérito é um manuscrito apreendido na sede do Partido Liberal (PL). O texto, encontrado na mesa de um assessor do general Walter Braga Netto, trazia propostas para interromper a transição de governo e "mobilização de juristas e formadores de opinião", culminando na frase "Lula não sobe a rampa", uma referência direta ao impedimento da posse do presidente eleito.
O manuscrito fazia parte da chamada "Operação 142", um plano que aludia ao artigo 142 da Constituição Federal, interpretado pelos investigados como base para uma ruptura institucional após a derrota eleitoral de Bolsonaro.
Lula sobe a rampa do Planalto e recebe faixa presidencial em 1° de janeiro de 2023 (Foto: Tânia Rego)
Próximos passos
O relatório foi enviado à Procuradoria-Geral da República (PGR), que analisará as acusações e decidirá se Bolsonaro e os demais indiciados serão denunciados ao STF pelos crimes apontados pela Polícia Federal. A decisão agora está nas mãos do procurador-geral da República, Paulo Gonet, que determinará os próximos desdobramentos jurídicos do caso.
- Foto: Valter Campanato